SOS | Batatas Fritas mantidas cativas por Irene
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Nunca pensei que num luminoso sábado de janeiro, em plena Amadora, me fosse deparar com uma situação digna de ser comentada na Crónica Criminal de um qualquer canal televisivo generalista. Hoje, passadas quase 24 horas do sucedido, ainda sinto um nó na garganta ao revisitar os acontecimentos que aqui vos relato.
Tudo se passou na Cervejaria Bogotá, espaço de restauração que certamente encantaria a Joana Amaral Dias, onde o dinheiro físico é rei já que o multibanco não é permitido. Talvez isso se deva ao facto da Bogotá ter sido fundada em 1943, e todos sabemos que as pessoas mais idosas não são assim muito adeptas das tecnologias (espero que o mau pai, nascido em 1945, não leia isto, caso contrário posso esperar levar um papo-seco na fuça da próxima vez que o vir).
Se subir para um banco alto cai fora das vossas habilidades físicas, ou se levarem uma cotovelada amistosa da pessoa do lado deixa-vos amargos até ao final do mês, então este não é o local para irem, porque aqui lugares só mesmo ao balcão. Confesso que só muito recentemente desenvolvi o gosto de estar na barra, muitas vezes espremido, outras quantas a pensar que ia cair do assento devido àquela caneca de cerveja fresquinha, mas com a alegria de quem se vê com as narinas inundadas de sabores deliciosos, de quem ouve as piadas de cunhado dos empregados cinquentões e que se perde a olhar para a comida dos vizinhos, pensando se ainda caberá mais um prego, a escorrer pecaminosamente calorias.
Mas voltemos ao relato dos acontecimentos que levaram à escrita deste post. Estava eu sentado na Bogotá, com a minha tulipa de cerveja preta, depois de já ter morfado uma sopa de grão e espinafres e dois salgadinhos (o croquete bate aos pontos o rissol de camarão), quando chega o prego no pão com queijo. Prontamente, antes mesmo de questionar, o empregado diz que as batatas ainda estão a fritar, mas não tardarão. Melhor, pensei eu para os meus botões (ou para o meu fecho éclair, que não estava com nada de botões), vão vir fresquinhas e quentinhas.
Ataco o prego sem misericóridia. A carne tenrinha, deliciosa, derretendo-se na boca. Rejeito o picante e a mostarda - a combinação de carne, queijo e pão é suficiente para me fazer ter um espasmo nas pernas. A vizinha do lado olha-me de soslaio, suspirando pelos meus pecados enquanto come uma taça a transbordar de salada de frutas. Em menos que um Pai Nosso e uma Avé Maria o prego desaparece, e nada de batatas. Questiono o empregado sobre se as mesmas estarão para vir, e com a desculpa mental de que não faz sentido comer batatas fritas a seco, mando vir um prego com bacon.
É nesse momento que o empregado cinquentão simpático se transforma em frente dos meus olhos num membro de um grupo especial de intervenção e marcha até à porta da cozinha, gritando pelas batatas à Irene. Vozes abafadas chegam do outro lado da porta, e não conseguindo perceber em detalhe a conversa, assumo que Irene está a negociar as condições de resgate dos meus tubérculos mergulhados em óleo. Aperta-se-me o coração, pensando naqueles palitos dourados, sozinhos e assustados, quando tudo o que queriam era estarem a nadar no meu suco gástrico. Olho para os lados tentando perceber se alguma alma caridosa irá juntar-se à causa fazendo pressão para que Irene liberte as batatas fritas mantidas cativas, mas tal não é preciso. O empregado dirige-se em passos rápidos, com um sorriso triunfante e um pires de fumegantes louras na mão.
Suspiro fundo de alívio fazendo a vizinha benzer-se em desespero, enquanto enfio três batatas na boca e os olhos se me enchem de lágrimas. Talvez por todo o stress da situação. Mais provavelmente pelo facto de elas estarem quentes como o caraças...